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Conservação em áreas de fronteira avança com apoio do ARPA
A gestão de Unidades de Conservação (UCs) em regiões de fronteira impõe desafios específicos, como o isolamento geográfico, conflitos transfronteiriços e atividades ilegais. Com apoio técnico e financeiro do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA), essas UCs têm avançado no fortalecimento istrativo, fiscalização e na articulação com comunidades indígenas e instituições parceiras. Ainda assim, este trabalho nestas regiões demanda esforços contínuos e articulação multissetorial para garantir a proteção da biodiversidade.
Pelo menos 11 Unidades de Conservação (UCs) na Amazônia brasileira estão localizadas em áreas de fronteira com outros países, atuando como barreiras naturais contra crimes ambientais e protegendo territórios de alta biodiversidade. Outras três, embora não estejam exatamente na linha de fronteira, também sofrem influência direta da dinâmica dessas regiões. Fazem parte desse grupo a Estação Ecológica do Grão-Pará (PA), a ESEC Rio Acre (AC), os parques nacionais da Serra do Divisor (AC), do Cabo Orange (AP), do Monte Roraima (RR) e Montanhas do Tumucumaque (AP), além dos parques estaduais Chandless (AC), de Corumbiara (RO) e Serra Ricardo Franco (MT), a Reserva Biológica do Guaporé (RO) e a Reserva Extrativista Chico Mendes (AC).
Já entre as UCs que não fazem divisa direta, mas estão em regiões sensíveis à influência das fronteiras, estão a Reserva Extrativista Rio Cautário (RO), a Reserva Extrativista do Rio Ouro Preto (RO) e o Parque Nacional Mapinguari (RO).
No Parque Nacional do Monte Roraima, a presença de garimpos ilegais nas áreas vizinhas da Venezuela e da Guiana é uma preocupação constante. A visitação desordenada de veículos oriundos da Venezuela também afeta comunidades indígenas locais.
“Essa região é conhecida por ser rica em minérios como ouro, cobre e diamante, o que leva à instalação de garimpos para a exploração. O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) monitora a área para que essa atividade não extrapole a fronteira com o Brasil e até mesmo envolva as etnias indígenas que residem na região”, explica Havana Maduro Viana, servidora do Núcleo de Gestão Integrada Roraima.
Além do garimpo, a visitação desordenada por veículos 4×4, provenientes da Venezuela, é uma preocupação. “Essa atividade modifica a rotina dos indígenas, causando perturbação e invasão da região onde estão localizadas suas moradias, além do impacto ambiental na vegetação, visto que essas pessoas não seguem os mesmos caminhos das trilhas já existentes”, afirma.
A gestão do parque, que se sobrepõe integralmente à Terra Indígena Raposa Serra do Sol, na etnorregião Ingarikó, é feita em parceria com o Conselho do Povo Indígena Ingarikó (COPING), líderes comunitários e a Fundação Nacional do Povos Indígenas. “Essa gestão conjunta visa fortalecer o diálogo e o respeito à cultura e tradições da etnia Ingarikó, além de inserir as decisões e planejamentos do parque”, diz Viana.
O envolvimento da comunidade indígena foi essencial na recente renovação do Plano de Manejo, que inclui capacitações para monitoramento ambiental. “Os Ingarikó são orientados a comunicarem ao ICMBio sobre qualquer movimento de ilícitos ambientais, formando uma parceria constante nessas áreas tão remotas”, completa.
O ARPA é o principal pilar financeiro do parque. “O Programa ARPA é o principal financiador das ações de gestão do parque, sejam elas externas para a fiscalização, gestão socioambiental, pesquisa e ordenamento territorial, incluindo também o fluxo istrativo e de logística necessários para que essas ações sejam realizadas”, destaca Viana. As operações de fiscalização, programadas anualmente, são viabilizadas por diárias, sobrevoos e combustíveis fornecidos pelo programa, compensando a escassez de recursos humanos e orçamentários.
Avanço na fiscalização em áreas sensíveis
No Mato Grosso, o Parque Estadual Serra Ricardo Franco, que faz divisa com o Parque Nacional Noel Kempff Mercado, na Bolívia, enfrenta pressões relacionadas ao desmatamento e à exploração ilegal de recursos. Elisa dos Santos Rezende França, analista de meio ambiente da Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA-MT), explica que a resposta a essas ameaças envolve ações integradas.
“A SEMA realiza fiscalização contínua e efetiva em parceria com órgãos estaduais e federais, por meio da Operação Amazônia, que envolve monitoramento em tempo real por satélite, fiscalização in loco, embargo de áreas, apreensão e remoção de maquinários e responsabilização dos infratores”, afirma. Atualmente, o parque possui sete termos de embargo ativos.
Diferentemente de outras UCs, a pressão de caçadores ou garimpeiros não é significativa. “A gerência do parque monitora as atividades e não há registro de que haja pressão por garimpeiros e caçadores”, diz França.
O apoio do ARPA tem sido essencial para manter a estrutura de fiscalização. “O Programa ARPA fortalece as ações de fiscalização e conservação com aplicação de recursos que possibilitam a aquisição e manutenção de bens e equipamentos, diárias e outros insumos que são utilizados na execução destas ações”, destaca.
No Amapá, o Parque Nacional do Cabo Orange, gerido pelo ICMBio, destaca o retorno da embarcação institucional como um avanço relevante para o fortalecimento da fiscalização. A proximidade com a Guiana sa exige constante vigilância, ainda que a cooperação transfronteiriça com autoridades sas seja limitada.
“Temos uma boa embarcação, adquirida pelo programa ARPA no ano de 2006 e recentemente reformada também com o apoio do programa. Na aquisição da alimentação e das diárias, o apoio do ARPA é essencial, além das constantes manutenções mecânicas e na pintura”, destaca Ricardo Pires, oceanógrafo, Chefe do Parque Nacional do Cabo Orange.
Parceria local e conservação transfronteiriça
O Parque Estadual Chandless, no Acre, apresenta um modelo de gestão marcado pelo fortalecimento do diálogo com os povos indígenas do entorno e com instituições peruanas que gerem unidades de conservação vizinhas. A principal pressão identificada é a caça predatória, com registro pontual de exploração de madeira para uso local. O trabalho conjunto com as Terras Indígenas Alto Purus (etnias Huni Kui e Madija), e Mamoadate (etnias Manchineri e Jaminawa), e com o Parque Nacional Alto Purus (Peru) tem potencializado a proteção ambiental em uma área contínua de mais de 8 milhões de hectares.
O Parque Chandless não está imune às pressões externas. A principal delas, segundo a gestora Flávia Souza, é a caça predatória. “Não há garimpos localmente e a retirada de madeira é seletiva e para uso local”, explica. A baixa densidade populacional dentro da UC (0,00014 habitantes por hectare) e o modo de vida tradicional dos ribeirinhos também contribuem para a baixa pressão ambiental.
“A aproximação tem tornado mais eficientes as trocas de informações, bem como o planejamento e as ações com as comunidades indígenas do entorno e com os gestores do Parque Nacional Alto Purus e da Reserva Comunal Purus, no lado peruano”, diz a gestora.
A integração entre os entes brasileiros e peruanos é fundamental, já que a região é habitada por populações indígenas em isolamento voluntário. “As três UIs no estado — Estação Ecológica Rio Acre, Parque Nacional Serra do Divisor e Parque Estadual Chandless — apresentam vestígios e avistamentos de indígenas em isolamento voluntário que percorrem sazonalmente as localidades. Também há ampla interface de uso de territórios com populações indígenas adas”, explica.
Flávia ressalta que a atuação do Parque é possível devido ao apoio técnico e financeiro do Programa Áreas Protegidas da Amazônia (ARPA). “Sem os recursos financeiros oriundos do ARPA, não seria possível alcançar os êxitos relatados”, diz. “O que proporciona a presença do Estado localmente só se viabiliza pelos recursos humanos existentes nos órgãos gestores, que operam os recursos financeiros e realizam as ações técnicas em campo.”
A gestora conclui: “A implementação dos instrumentos de gestão, associada à presença constante de agentes públicos no território, com agendas positivas junto às comunidades e ações de fiscalização periódica, inibe a realização de ilícitos. Isso não quer dizer que não existam, mas os impactos gerados pela degradação ambiental são minimizados quando comparamos ao entorno.”
O ARPA – Áreas Protegidas da Amazônia é um projeto do Governo do Brasil, coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e tem o FUNBIO como gestor e executor financeiro. É financiado com recursos de doadores internacionais e nacionais, entre eles o governo da Alemanha por meio do Banco de Desenvolvimento da Alemanha (KfW), o Global Environment Facility (GEF, na sigla em inglês) por meio do Banco Mundial, a Fundação Gordon and Betty Moore, a AngloAmerican e o WWF.